Art. 1º Mãos ao alto; Art. 2º Revogam-se indisposições em contrário

Demóstenes Torres*

Duas multinacionais brasileiras campeãs em crescimento no mundo são o Primeiro Comando da Capital e o Comando Vermelho, líderes de um ramo de negócios com outras 70 corporações que estão em 600 milhões de narinas planeta a dentro. Aqui, são auxiliadas por legislação frouxa, passadas de pano das autoridades e falta de priorizar a segurança pública nos âmbitos federal, estaduais e municipais. Nenhuma atividade recebe mais incentivo, por ação ou omissão, do que o crime, por isso é organizado, lucrativo e exemplo para seus seguidores nos dois lados do Atlântico.

Nesta terça-feira, 8.abr.2025, a Câmara dos Deputados recebeu proposta de emenda à Constituição sobre o assunto. Se dependesse de comentaristas de mídia digital e da audiência de podcasts, o inteiro teor da PEC seria como o historiador Capistrano de Abreu (1853/1927) receitou que fosse a Carta Magna, imitando a Lei Áurea e limitada a 2 artigos:

Art. 1º Todo bandido deve ter o CPF cancelado.
Art. 2º Revogam-se as disposições em contrário.

Entre esse horror que aí está e o radicalismo de quem não aguenta a folga dos marginais, habita o bom senso a exigir coragem de integrantes de Executivo, Legislativo e Judiciário. A nação se cansou de empurrar o problema com a barriga esfaqueada, o umbigo rodeado de balas, conforme cantam Léo Canhoto e Robertinho. Chega de açúcar e afeto!

Muita coisa precisa ser feita com urgência, aliada a profundidade e rigor, senão vamos permanecer no fundo da vala a que fomos empurrados com a mala cheia de direitos e garantias constitucionais:
ter um celular para si e outro para o malfeitor, que o trocará por uma cervejinha e pedras de crack;
considerar parte da paisagem as cracolândias, antes restritas a cidades grandes, hoje com uma franquia por CEP;
ser obrigado a desobedecer às regras e instalar blindagem de carro-forte proibida, pois a regulamentada não resiste às armas comuns penduradas no pescoço das quadrilhas da esquina, os fuzis;
morar numa unidade da federação maior que Minas Gerais, o Estado Paralelo, com 23 milhões de pessoas sitiadas por máfias em territórios onde as polícias não entram;
viver sempre à espera das ações de estupradores, assassinos e traficantes que são presos diversas vezes e logo soltos, graças aos textos legais, legais até em excesso.

A novidade é a ascensão do delito como método. Nada de espanto. Especialista em erva, pó e drogas sintéticas, o crime organizado controla transporte urbano em São Paulo, vans e mototáxis nas comunidades cariocas, construção civil e especulação imobiliária fluminenses, cybercangaço no Ceará, garimpo e madeira na região Norte, socorro a desabrigados no Sul.

Ou seja, não discrimina faturamento, pode ser inclusive de bens lícitos. Em favelas do país inteiro, fornece botijões de gás e água 50% inferiores na quantidade de produto e 30% superiores no preço. Comerciantes pagam extorsão a foras da lei e agentes da lei, que a esta hora devem ter aproveitado o tarifaço do Trump para reajustar a mensalidade semanal ou diária, sabe-se lá, quem subverteu os códigos está apto a mudar a filologia.

Enfim, uns discutem o nome da nova polícia, outros querem somente que haja polícia e que a polícia aja. Uns almejam status constitucional ao Sistema Único de Segurança Pública, como mal e porcamente existe para o SUS, outros sonham apenas com o trecho que lhes assegura ir e vir com seus bens. Uns planejam instituir o Fundo Nacional de Segurança Pública e Política Penitenciária, outros desejam descobrir o que há no saco sem fundo das verbas de combate aos efeitos da violência.

Fui senador de oposição a Lula 1 e 2 e Dilma 0,37. Presidi a Comissão de Constituição e Justiça. Tive mandatos de relator-geral na Subcomissão de Segurança Pública. Atuei em centenas de projetos na área. Em nenhum momento vi interesse da esquerda com a tranquilidade nas ruas, a paz nos lares, o sossego nas lojas, a normalidade no campo.
Portanto, não importa quem seja o ministro do setor ou a reivindicação da sociedade, Lula et caterva cumprem o que a ideologia manda: afago no arrombador de residências, carinho no mão de elástico, liberdade para o traficante, entorpecente para o usuário, impunidade para a companheirada que invade fazenda, vistas grossas para os vândalos mascarados que destruíram prédios oficiais na Praça dos 3 Poderes em 2017. Na época, a Polícia Militar calculou em 45 mil os baderneiros que depredaram geral, a CUT afirmou que foram 200 mil e nada aconteceu a qualquer deles.

A torcida é para que a PEC da Segurança detenha PCC, CV e seus 70 similares, antes que virem centenas. Que iniba a vinda e a venda de drogas. Que enjaule quem comete infrações graves. Que evite a circulação de condenados a regime fechado. Que o estudante e o trabalhador voltem para casa numa boa. Que o motorista pare no semáforo e assovie despreocupado sem ouvir o grito de “Perdeu!”. Que o empreendedor honesto chegue aonde a globalização o levar, sem temer as facções, menos ainda as que fabricam tributos. Não tem sido assim. Desde 1988, o Brasil ganhou 8 milhões de normas. Bastaria uma, com 2 artigos:

Art. 1º Parem de pensar que a vítima de crimes não sabe que vocês têm medo dos bandidos.
Art. 2º Revogam-se as disposições em contrário.

Demóstenes Torres é advogado e articulista do Blog do Alan Ribeiro e Portal do Alan

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