
Com um pré-candidato que resolveu o problema da segurança em seu Estado e pode resolver no país, o UB vai bancá-lo pra presidente ou vai acovardar-se ante o interesse pessoal de políticos sem estatura moral?
O pernambucano Marco Maciel (1940-2021) — cujo perfil longilíneo conferiu-lhe o apelido de Chile — foi governador, senador e vice-presidente da República (companheiro discreto e eficiente de Fernando Henrique Cardoso, duas vezes presidente). Grande leitor — de livros e da política —, era, acima de tudo, um sábio. Ele costumava dizer que time que não joga não tem torcida. Era filiado ao PFL, antecessor do União Brasil.
Sua fala é, claro, uma referência (metáfora) mais política do que futebolística. Marco Maciel quis dizer, isto sim, que partido que não disputa eleição não chega ao poder, quer dizer, não governa. Fica sempre em segundo plano. Como eterno reserva.
No Brasil, há uma longeva tradição de fisiologismo político. Há líderes partidários, instalados no centro político (mas não só), às vezes chamado de Centrão, que se tornam verdadeiras “rêmoras” dos governos.
O Centrão (só muda, quando muda, os personagens) participou dos governos da ditadura e está fincado nos governos civis desde a gestão de José Sarney.

Os políticos do Centrão são realistas absolutos. De um pragmatismo ímpar. Ideologias — como direita e esquerda — não fazem parte de suas preocupações. Não são de esquerda, mas também não são de direita, ao menos não são de extrema direita.
Os centrãozistas são, no geral, governistas. Se o governo é de esquerda, sem discutir a ideologia do aliado, integrantes do Centrão se instalam, de maneira confortável e mimetizadora, e retiram o máximo de proveito das estruturas públicas. Cargos com orçamento elástico que possam render um dinheirinho extra são sempre bem-vindos.
Não se está insinuando que todos os “a-ideológicos” (se isto existe) do centro são corruptos. Na verdade, não são. Há os que são, os que mais aparecem nos palcos federal e estaduais. São políticos que apreciam la dolce vita — apartamentos e casas espaçosos, viagens para Paris, Londres e Nova York, contas bancárias à prova de Ozempic e Mounjaro, vinhos de 12 mil reais, restaurantes e hotéis cinco estrelas etc. Coisas que quase todos os seres humanos, os não espartanos, cobiçam.
Quando se associam a um governo, os membros do Centrão não o largam mais. São carrapatos políticos. José Sarney (MDB), Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Lula da Silva (PT), Dilma Rousseff (PT), Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (PL) sabem disso. (Paradoxalmente, a turma do Centrão é democrática e, por isso, não apoiou o golpismo da direita bolsonarista.)
Mas os leitores decerto vão dizer: “Os jornais dizem que os membros do Centrão sugerem, nas manchetes, que vão deixar o governo Lula”.
As manchetes são essas, mas poucos jornais observam se, durante dois anos e três meses, algum integrante do centro deixou o governo de Lula da Silva. O fato é que não saem, sobretudo porque a gestão do petista-chefe ainda tem um ano e nove meses pela frente.
Há muita carne para arrancar dos “ossos” do governo de Lula da Silva (um ano e nove meses são uma “eternidade”). Por isso, a turma do Centrão — que inclui do PP ao União Brasil —, apesar das pressões e dos “anúncios”, vai ficar acoplada à nave-mãe do petismo até 2026. Sairá quando exatamente?
Quase ninguém entende tanto de política, a do real e não a do ideal, quanto os formuladores do Centrão (o senador Ciro Nogueira e Arthur Lira, do PP, não são intelectuais, mas sim políticos de rara habilidade e pertinácia). Por isso, não sairão do governo Lula da Silva agora.
Mas poderão deixá-lo se, em 2026, notadamente entre maio e julho, os índices de popularidade de Lula da Silva permanecerem baixos ou caírem ainda mais.
Os centrãozistas estão observando o quadro com extrema atenção. Não hesitarão em deixar Lula da Silva na chapada da infelicidade. Porém, poderão manter o apoio se o petista-chefe se recuperar e voltar a ser consistente eleitoralmente.
O União Brasil, para citar um exemplo, é de direita, mas tem três ministérios no governo de Lula da Silva. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, é filiado ao UB, mas articula pró-governo do petista.
O nome do partido do senador Ciro Nogueira é Progressistas (então, não é PP, no máximo é PP), o que sugere proximidade ideológica com o PT. Na realidade, o PP é de centro-direita. Seu nome mais preciso seria Partido do Governo (PG). Ou Partido do Governismo.
Como o Centrão vai se comportar em 2026, no momento adequado? Vai jogar com três hipóteses, até transformar uma delas em tese.
Primeiro, poderá manter-se aliado de Lula da Silva. Segundo, se o candidato do bolsonarismo — Tarcísio de Freitas ou outro — estiver bem, o Centrão poderá, de maneira resoluta, trocar de lado (frise-se que o indefectível Ciro Nogueira não apoia a gestão do petista, mas seus aliados estão grudados e exigindo mais espaço. Arthur Lira quer ser ministro? É o que parece). Terceiro, se Ronaldo Caiado crescer, de maneira estável, poderá apoiá-lo.
No momento fala-se em federação (e, quem sabe, fusão) entre o pP e o União Brasil. Com qual objetivo? Ao ficar mais forte, a dupla poderá lançar um candidato a presidente da República? Não é bem assim.
Na verdade, líderes dos dois partidos — não todos, frise-se — querem aumentar seu valor de troca para 2026. Ciro Nogueira, por exemplo, opera para ser vice do candidato a presidente do bolsonarismo.

O União Brasil poderá lançar o vice de Lula da Silva ou de Tarcísio de Freitas? Em termos de Brasil, país no qual os donos do poder negociam tudo, até a alma, nada é impossível.
Ronaldo Caiado, Tarcísio de Freitas e segurança
O União Brasil tem um candidato a presidente consistente. Trata-se do governador de Goiás, Ronaldo Caiado. Se bem trabalhado, com um marketing de primeira linha, tem chance de ser eleito. Porque representa uma direita civilizada que apresenta resultados (nas áreas de segurança, educação, saúde, social e infraestrutura), com equilibro político, respeito às instituições e probidade pessoal e administrativa.
Ronaldo Caiado talvez seja aquele candidato que o Brasil quer e precisa. Em termos políticos, é diferente tanto de Jair Bolsonaro (PL) — um extremista de direita avesso à democracia — e de Lula da Silva, um moderado de esquerda que, no momento, faz um governo apenas mediano, daí sua impopularidade crescente.
Como Jair Bolsonaro está inelegível e corre risco de ser preso, o bolsonarismo tende a apostar em Tarcísio de Freitas (Republicanos) para presidente (a rigor, o governador de São Paulo quer ser candidato à reeleição). O jovem engenheiro é gestor eficiente. Mas não está conseguindo equacionar um dos problemas que mais afligem os paulistas.
Há em São Paulo, neste momento, dois Estados. Um, o oficial, é governado por Tarcísio de Freitas. O outro é gerido pelo “governador” Marcos Willians Herbas Camacho (filho de pai boliviano e mãe brasileira), mais conhecido como Marcola, o poderoso chefão do Primeiro Comando da Capital (PCC), que está preso em Brasília.
São Paulo é o Estado mais rico e, ao mesmo tempo, um dos mais inseguros para a população. O crime organizado, via PCC, mantém o Estado oficial e os paulistas acossados. Tarcísio de Freitas, gestor competente em infraestrutura, não tem conseguido revolver o problema da violência, da insegurança.
O PCC contaminou de tal forma a Polícia Civil e a Polícia de São Paulo que não se sabe mais quem chefia as duas — se Tarcísio de Freitas ou se Marcola Camacho.
Se não consegue resolver o problema do crime organizado em São Paulo, um Estado, como Tarcísio de Freitas vai conseguir resolvê-lo num país continental como o Brasil? O governador parece ter perdido o controle — se é que o teve algum dia — das polícias Civil e Militar.
Numa campanha eleitoral, o bolsonarismo terá dificuldade de apresentar Tarcísio de Freitas como “combatente” — ativo e não meramente reativo — do crime organizado. Se o governo Lula da Silva não funciona, em termos de segurança, o governo do jovem carioca segue na mesma toada.
Em Goiás, sob Ronaldo Caiado, o crime organizado não dá as cartas. Sim, o PCC e o Comando Vermelho operam no Estado, mas em muito menor escala. Não configura um segundo Estado.
O governo de Ronaldo Caiado age de maneira dura no combate ao crime organizado. Há firmeza nos confrontos, mas, sobretudo, há um serviço de Inteligência eficiente.
Muitas vezes, os membros do PCC são presos antes mesmo de agirem. Há, portanto, uma sintonia fina entre prevenção e combate. Em São Paulo, o PCC conta com os préstimos de integrantes, em cargos diretivos, da Polícia Civil e da Polícia Militar. Isto é grave. Gravíssimo.
Então, o União Brasil tem um pré-candidato que resolveu o problema da segurança em seu Estado e, por isso, pode resolver no país. O partido vai bancá-lo para a Presidência da República ou vai acovardar-se ante o interesse “particular” de políticos pequenos, às vezes sem estatura moral?
Repetindo Marco Maciel, time que não joga não tem torcida, ou seja, não conquista o poder. Com Ronaldo Caiado, com seu discurso independente e crítico, elaborado por uma direita civilizada e não golpista, o União Brasil tem uma alternativa real, com possibilidade de eleger o próximo presidente da República. Por que não arriscar? Quem arrisca pode perder, mas também pode ganhar.
O que não se pode é transformar um partido importante, como o União Brasil, num balcão de negócios. Porque, a médio ou longo prazo, pode ser o seu fim.
Euler de França Belém