Horizonte ameaçado: o fim do compartilhamento de torres de telecomunicações

Haroldo Naves*

Imagine abrir a janela pela manhã e, no lugar do horizonte familiar delineado por casas e outras edificações que contam a história da sua cidade, deparar-se com uma “floresta” de estruturas metálicas que dominam a paisagem.

Essa não é uma cena tirada de um conto sobre um futuro distópico, mas sim um possível cenário resultante de uma lei em discussão no Supremo Tribunal Federal (STF), na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7708.

A ação questiona o fim da obrigatoriedade do compartilhamento de torres de telecomunicações dentro de um limite de 500 metros, alteração promovida pelo artigo 12, inciso II, da Lei nº 14.173/2021. Em setembro do ano passado, o relator da ADI, o ministro do Supremo Flávio Dino, determinou o restabelecimento da norma que prevê o compartilhamento obrigatório, mas um pedido de vistas apresentado pelo presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, adiou a decisão, que precisa ser referendada por todo o plenário do STF.

O fim da obrigatoriedade é uma mudança controversa introduzida por meio de um verdadeiro contrabando legislativo que afronta nossa Constituição Federal e ameaça impactar negativamente a vida de milhões de brasileiros e o futuro das nossas cidades.

Por essa razão, dez associações que representam municípios de várias regiões do país pediram para participar do julgamento da ADI como amici curae (amigas da corte), para levar aos ministros do STF um alerta urgente sobre os múltiplos impactos negativos que o fim dessa obrigatoriedade pode provocar, o que claramente revela a grande preocupação dos gestores municipais sobre esse tema tão sensível.

O primeiro deles é o comprometimento do planejamento urbano. Nossas cidades, que já enfrentam desafios monumentais para superar a falta de infraestrutura, podem ser impactadas pela instalação desordenada de torres de telecomunicações.

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A poluição visual resultante das torres desnecessárias não apenas deturparia a paisagem urbana, mas também poderia desvalorizar áreas residenciais e comerciais, afetando a economia local e a qualidade de vida dos habitantes.

São os municípios que têm a responsabilidade constitucional de zelar pelo ordenamento territorial e pelo bem-estar de seus cidadãos, e eles ficariam impedidos de exercer seu dever, se as cidades forem invadidas por estruturas sem qualquer obrigação de compartilhamento ou coordenação entre os prestadores de serviço.

A ausência de regulamentação adequada abriria espaço para uma instalação desenfreada, com cada empresa individualmente colocando suas torres multiplicando desnecessariamente a infraestrutura, ignorando o impacto coletivo e desrespeitando os planos diretores municipais.

Além do caos urbano, sem o compartilhamento de torres, as operadoras enfrentariam custos operacionais mais elevados, que, inevitavelmente, seriam repassados aos consumidores.

Em um país já marcado por profundas desigualdades, isso pode tornar o acesso à internet e a outros serviços essenciais ainda mais distantes das camadas menos favorecidas, aprofundando o abismo digital que já segrega a população.

O compartilhamento de estruturas não é apenas inteligente — é indispensável. Se cada operadora construísse suas próprias torres de telecomunicações, individualmente, os custos seriam proibitivos, o impacto ambiental, alarmante, e as cidades ficariam repletas de estruturas metálicas desordenadas.

Por isso, manter a obrigatoriedade de compartilhamento das torres não é somente uma questão técnica ou mercadológica, mas uma política social estratégica.

É um passo fundamental para reduzir o gap digital, permitindo que mais brasileiros tenham acesso às ferramentas indispensáveis para educação, trabalho e participação cidadã. A conectividade deve ser um direito de todos, não um privilégio de poucos.

Aliás, a inspiração para a defesa da causa do compartilhamento ordenado vem das ruas, mais precisamente dos postes e do problema que hoje eles se tornaram, exatamente pela falta do ordenamento do seu compartilhamento.

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É necessário regulamentar o uso compartilhado das torres para evitar que elas se tornem amanhã, os postes de hoje.

Diante de tais ameaças, é imperativo que, além dos relevantes aspectos legais, o Supremo considere também os impactos sociais, urbanos e ambientais que sua decisão trará.

As entidades representativas de municípios não levantam essas questões por capricho, mas em defesa do interesse público e do futuro das nossas cidades. Elas falam em nome de dezenas de milhões de brasileiros que poderão ser diretamente afetados pelas consequências dessa eventual proliferação descontrolada de torres.

Que a decisão do STF na ADI 7708 reflita esse compromisso com um futuro mais justo e equilibrado, mantendo a obrigatoriedade do compartilhamento das torres de telecomunicações.

Haroldo Naves
Presidente da Federação Goiana de Municípios

Este artigo tem o apoio das seguintes entidades:
Associação dos Municípios do Paraná
Federação Goiana de Municípios
Associação dos Municípios Adjacentes de Brasília
Associação dos Municípios do Acre
Associação Goiana de Municípios
Associação dos Municípios do Mato Grosso do Sul

Haroldo Naves Soares é formado em Gestão Pública pela UEG-GO, prefeito de Campos Verdes GO por três mandatos, ganhador do Prêmio Prefeito Empreendedor, em nível nacional, do SEBRAE (2003), consultor do SEBRAE, recebeu prêmio Boas Práticas Administrativas, concedido pelo ONU em 2004, é Presidente da Federação Goiana de Municípios – FGM e já exerceu a Vice-Presidencia da Confederação Nacional dos Municípios – CNM
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Alan Ribeiro
Alan Ribeiro

Alan inicia seus trabalhos com o único objetivo, trazer a todos informação de qualidade, com opinião de pessoas da mais alta competência em suas áreas de atuação.

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