“Justiça é lenta, é cega, é burra, mas ela chega”, afirmou juíza.
O 4º Tribunal do Júri do Rio de Janeiro condenou, nesta quinta-feira, 31, os ex-policiais militares Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz pelos assassinatos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes. Lessa foi condenado a 78 anos, 9 meses e 30 dias de prisão, enquanto Élcio recebeu uma pena de 59 anos, 8 meses e 10 dias. Além das penas privativas de liberdade, os réus foram sentenciados a pagar uma pensão mensal ao filho de Anderson, Arthur, até que ele complete 24 anos, e a indenizar cada uma das vítimas envolvidas – incluindo a filha de Marielle, Luyara Santos, e sua mãe, Marinete da Silva – em R$ 706 mil por danos morais.
A decisão encerra mais uma etapa de um processo marcado por uma complexa investigação desde o atentado que ocorreu em 14 de março de 2018, quando Marielle, após participar de um evento na Lapa, retornava para casa. O veículo foi alvo de disparos, matando a vereadora e seu motorista e ferindo a assessora Fernanda Chaves, que sobreviveu ao ataque. O Júri reconheceu a culpabilidade de Lessa e Queiroz em crimes de duplo homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, emboscada e recurso que dificultou a defesa das vítimas), tentativa de homicídio contra Chaves e receptação do veículo usado no crime.
Durante o julgamento, o MP/RJ destacou que o crime teve motivações políticas e financeiras, ressaltando que Ronnie e Élcio teriam aceitado o trabalho para eliminar Marielle em razão de seu trabalho legislativo e de sua atuação política. Segundo o MP/RJ, Ronnie Lessa, que teria executado os disparos, começou a planejar o crime ainda em 2017, realizando buscas na internet sobre a vereadora e formas de execução sem rastreamento. A Promotoria apresentou evidências de que, além de investigar a rotina de Marielle, Lessa e Queiroz buscaram informações sobre outros políticos associados a ela.
O julgamento teve como assistente de acusação a defensora pública Daniele Silva, que trouxe ao debate o aspecto racial do crime, apontando que Marielle, mulher negra e oriunda de uma comunidade marginalizada, representava uma figura de resistência e enfrentamento às estruturas políticas e sociais. A composição do Júri, formada por sete homens brancos, não incluía mulheres negras – fato mencionado pela acusação como uma possível limitação de representatividade. Entretanto, o MP/RJ argumentou que a decisão deveria basear-se nos valores e no compromisso dos jurados com a Justiça.
Em ua sentença, a juíza Lúcia Glioche enfatizou que a Justiça, embora muitas vezes lenta e imperfeita, alcança os culpados. Destacou ainda que a condenação de Lessa e Queiroz representa uma resposta institucional aos que acreditavam que o crime ficaria impune.
“A Justiça por vezes é lenta, é cega é burra, é injusta, é errada, é torta. Mas ela chega. Mesmo para acusados que acham que jamais vão ser atingidos. A Justiça chega aos culpados e tira o bem mais importante deles, depois da vida, que é a liberdade.”
O caso também se estende ao STF, onde um processo paralelo julga possíveis mandantes do crime, incluindo Chiquinho e Domingos Brazão – respectivamente, conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro e deputado Federal. O ex-chefe da Polícia Civil do Rio, delegado Rivaldo Barbosa, também é acusado de ter dificultado as investigações. Outros envolvidos, como o major Ronald Paulo Alves Pereira e o ex-assessor de Domingos Brazão, Robson Calixto, também respondem judicialmente por ações de apoio à execução do crime.
O promotor Eduardo Morais, que atuou no caso, anunciou que o Ministério Público revisará a sentença para avaliar uma possível discrepância entre as penas de Ronnie e Élcio, com uma diferença de quase 20 anos entre as condenações. Caso haja fundamento, o MP/RJ poderá recorrer da decisão para uniformizar as penalidades impostas.
Com informações do TJ/RJ e da Agência Brasil.
Fonte: Portal Migalhas