Xícaras, pires e pratos com design exclusivo e que terão venda on-line se somam aos já conhecidos vasos para jardinagem e decoração.
No mercado há 56 anos, a Cerâmica Boa Nova, de Ipameri, no Sudeste goiano, éconhecida pela produção de vasos para jardinagem e decoração cujo diferencial está nas técnicas originais desenvolvidas por artesãos do município. As peças são produzidas em tornos, com argila vermelha, a chamada terracota, e distribuídas nacionalmente por grandes redes como Carrefour, Extra e Leroy Merlin. Na pandemia, a fábrica desenvolveu também peças funcionais esmaltadas, como xícaras,.pires e pratos, que têm mais valor agregado e começam a ser comercializadas.
A nova linha de produtos, que em breve terão vendas também on-line, é aposta para recuperar o faturamento que, na contramão de muitos negócios, cresceu bastante em 2020 e 2021, nos períodos de isolamento social, quando as pessoas ficaram mais em casa e se dedicaram ao paisagismo, o que fez aumentar as vendas de vasos para jardins e interiores. Mas em 2022, veio o impacto de forte retração.
“O movimento caiu pela metade”, relata Luiz Alberto Costa, diretor da Cerâmica Boa Nova.e também da Associação Adelino de Carvalho, que mantém o projeto social Boa Nova, com atividades para crianças e adolescentes, em grande parte com os recursos provenientes das vendas das peças de cerâmica.
A Associação reúne 40 colaboradores, 25 dos quais entraram como alunos e hoje trabalham na produção da cerâmica. Há ainda a colaboração de ex-alunos do Projeto Boa Nova que hoje têm cerâmicas ou produzem peças nos quintais de casa. O próprio Adelino foi aluno, aos 14 anos, e conta que já completou 45 anos atuando na instituição, agora à frente do módulo de cerâmica, além de outras atribuições.
O diretor define 2022 como um ano difícil para o negócio de cerâmica artesanal. “É como uma montanha russa, sempre com altos e baixos, mas nesses mais de 56 anos nunca faltou caixa para pagar a folha dos trabalhadores registrados nem as bolsas dos alunos.” Para vencer o desafio atual de incrementar as vendas, as peças funcionais esmaltadas despontam como caminho a seguir. “É nossa aposta sim, um produto bastante diferente, um presente singular”, elogia.
Os planos são de vendas pela internet, com distribuição pelos Correios, por se tratar de peças menores e de maior valor agregado, o que compensa o custo da entrega. “Vasos de terracota são peças baratas e pesadas, não tem como vender por esse sistema de entrega”, compara.
Matéria-prima própria
“A gente tem de ir acompanhando as mudanças”, concorda Beth Costa, instrutora da Cerâmica Boa Nova. Foi ela que formulou o esmalte usado nas peças utilitárias.
“Começamos comprando o esmalte, fabricando as peças e ensinando a esmaltar. Depois comecei a formular nosso próprio esmalte e hoje já somos uma equipe nesse setor”, descreve.
O próximo passo é a formulação da argila básica, apropriada à alta temperatura, informa Beth, explicando que a matéria prima para as peças esmaltadas, comprada em São Paulo, é mais cara. No caso da cerâmica decorativa dos vasos, a terracota é adquirida em grandes volumes na própria região, onde existem duas fontes. “Estamos trabalhando a argila para chegar ao ponto de suportar alta temperatura e receber bem o esmalte. Se Deus quiser, no ano que vem vamos estar de massa nova, nossa”, prevê.
No momento, as vendas são feitas na loja em Ipameri, que se tornou um ponto de atração para quem visita a “Cidade da Cerâmica em Goiás”, a 198 quilômetros de Goiânia. As vendas on-line estão previstas ainda para este fim de ano. As peças de “cores autorais”, como define Beth, formuladora dos esmaltes, foram inseridas na Casa Cor em Goiânia e podem ser adquiridas também em loja colaborativa em Brasília e no Centro Sebrae de Referência do Artesanato Brasileiro (Crab), no Rio de Janeiro.
Para produzir linhas originais, com design exclusivo, cada um dá sua contribuição criativa, no laboratório. “Comecei fazendo as cores, formatos, modelos, depois fomos chegando a determinados pontos”, comenta a instrutora também das aulas de cerâmica do projeto social, uma das ofertas de aulas de artes, além dos cursos de música, informática e futebol.
Beth diz ter aprendido o ofício que hoje ensina porque sempre gostou da instituição, na qual entrou com 20 anos de idade e ficou por duas décadas, antes de sair para se dedicar a funções públicas. Depois da aposentadoria, decidiu voltar, contribuindo com a nova proposta de peças utilitárias esmaltadas.
“Vim especificamente para trabalhar na área de produção de peças utilitárias esmaltadas. Passei a ensinar, logo começamos a produzir, fiz um curso on-line que deu base boa às minhas pesquisas para formular nosso esmalte. E hoje já trabalhamos com nosso próprio esmalte”, observa.
A esmaltação consiste em aplicar sobre as peças camadas vítreas, que dão cor às peças. Para aprimorar essas técnicas e também as de engobe, o Projeto Cerâmica Viva, que tem apoio do Fundo de Arte e Cultura de Goiás, oferece cursos gratuitos em Ipameri. Os alunos aprendem a formular as próprias cores de esmalte e a queimar as peças de argila em temperaturas superiores a 1.200 graus celsius.
O engobe, esclarece Beth, é um líquido feito da própria argila, devidamente coado até chegar à consistência para dar o banho nas peças. “Damos o curso, mas não estamos produzindo, não dá pra investir em tudo de uma vez, não é uma técnica para peça utilitária, mas um trabalho mais rústico.” A instrutora acredita que o mercado mais promissor é mesmo para peças em esmalte, em que há maior procura.
Responsabilidade social na origem do negócio
O projeto social Boa Nova, da Associação Adelino de Carvalho, em Ipameri, no Sudeste goiano, atende 80 crianças e adolescentes no período vespertino e se prepara para atender outros 40 no período matutino. Todo o projeto é custeado pela venda de peças da Cerâmica Boa Nova, e também por parcerias via leis de incentivo à cultura. São oferecidas aulas de informática, música, cerâmica e reforço escolar, além do resgate de brincadeiras antigas.
O projeto também tem uma vertente profissionalizante. Entre 13 e 16 anos, os adolescentes começam a se capacitar nas áreas de edição de vídeo e áudio, programação e de produção da cerâmica manual e em torno. Para isso, eles se tornam bolsistas e recebem entre R$ 180 e R$ 250 por mês.
O valor é definido por meio de avaliação da escola que o jovem frequenta e leva em conta a frequência e a disciplina em sala de aula. Entre 16 e 17 anos, esses adolescentes se tornam estagiários e começam a auxiliar os professores nas aulas dos menores, e com isso, eles ganham um pouco mais.
O projeto social foi fundado por Margarida Fernandes Horbylon, com objetivo de dar oportunidade a crianças que viviam nas ruas e de famílias de menor renda. Ela decidiu criar um curso de cerâmica, origem da Cerâmica Boa Nova, que forma até hoje inúmeros ceramistas e produz peças cuja qualidade e originalidade conquistaram o mercado nacional, com vendas em grandes redes.
Fonte e Fotos: Jornal O Popular