
Bastava uma ligação para se conhecerem. O telefone tocou no meio da tarde quando a roupa era estendida no varal. Ao atender o aparelho doméstico reconhecia naquela voz um encontro entre poetas e que marcaria definitivamente a sua vida. Sempre quis escrever cartas de amor aos jornais mesmo sabendo que talvez elas não seriam recebidas ou respondidas. No dia marcado, aquele encontro já tinha sido escrito como a declaração de um poema feito no papel e entregue posteriormente após o café.
Revivia naquelas paredes uma história atrás dos quadros, pela mesa de jantar, no canto para rezas noturnas, nas taças de vinho nunca antes utilizadas e naquela cama que permitiria abraços, carícias e beijos em constantes movimentos e um pedido de namoro. Já estavam apaixonados. Mas parece-me que eles ainda não sabiam. Amaram-se muitas vezes e por um bom tempo. Momentos juntos, cartas, ligações recebidas antes pela casa da avó e depois em seu aparelho celular eram constantes. Quem diria que em tempos tecnológicos e facilidade para solicitar qualquer pedido, o telefone de uso público da esquina também receberia provas de amor e lamentos?
O amor que escrevia nos poemas desde os 14 anos nem chegava aos pés de toda a experiência que foi vivida. Os dias juntos eram riscados no calendário como amostra de eternidade mesmo que as horas voassem. A cada despedida surgia a esperança de que em breve se reencontrariam. Nem que fosse aos finais de semana. Contudo, a comunicação ao longo da semana continuaria. O que hoje é sentido como vácuo, esquecimento, preguiça, naquele tempo era identificado como paciência, compreensão e carinho. Mesmo com todas as facilidades ainda lembrava-se do namoro do passado mesmo com todas as dificuldades enfrentadas.
Vieram outras cartas perfumadas do envelope ao que estava escrito. Todas foram guardadas. Os e-mails chegavam como consolo de um possível abraço e reencontro de almas feridas. A oração na igreja somente permitiu que ele se fosse para outros braços. Seria o destino? Talvez. Outros momentos chegaram, as águas passaram por aquele coração e debaixo da ponte. Ela nunca esqueceu o amor de outrora. Nenhum que conhecia era o seu primeiro namorado. Nunca falaram em casamento ou filhos, apenas se amavam. Porém, o que começa sempre termina de alguma forma. Cada exposição da ferida tornava-a mais forte, querida para si mesma. Já havia enfrentado todo tipo de sofrimento e turbilhão de sentimentos. Nada fazia com que ele se aproximasse, a não ser pelas lembranças. Descobriu que ele era humano, portanto imperfeito e pecador. Ela só queria lembrar dos bons momentos vividos permitindo com que o tempo pudesse finalmente declarar o amor para si mesma que buscava em alguns laços.