Reportagem acompanhou um dia de atendimento do médium João Berbel no interior de SP
Mesmo assim, havia dificuldades para andar em alguns setores neste sábado (15), enquanto o “doutor Alonso” não iniciava os trabalhos. Berbel, 63, afirma incorporar o espírito do médico Ismael Alonso y Alonso, ex-prefeito de Franca, que morreu em 1964.
“Um médium só é derrubado por dinheiro, sexo e vaidade. É o que derruba”, disse o médium à Folha enquanto autografava livros psicofonados –no espiritismo, é a comunicação de espíritos através da voz do médium.
A afirmação foi uma resposta ao questionamento da situação de outro médium, João Teixeira de Faria, 76, o João de Deus, alvo de denúncias de crimes sexuais na Casa Dom Inácio de Loyola, em Abadiânia (GO).
“Já até me confundiram com ele [depois da revelação das denúncias], por causa do nome, mas não tenho nada a ver com isso”, disse.
Berbel ainda afirmou ser “necessário que haja escândalo”, mas que ele será julgado por Deus, não pelos homens. “Lobo só cai em armadilha de lobo. Ovelha não cai em armadilha de lobo.” Disse ainda que seu coração fica apertado com as denúncias recebidas pelo médium e disse ter pedido a Deus que o ilumine.
Berbel iniciou atendimentos em casa, em 1996, que hoje são feitos num imóvel de 8.000 metros quadrados de área construída em Franca, cidade com 350 mil habitantes e que tem cerca de 80 centros espíritas. O terreno foi doado por uma família.
A reportagem acompanhou a chegada de frequentadores e a triagem dos casos, os trabalhos feitos e as consultas e retornos de cirurgias. Antes das 8h já havia pessoas no local –os atendimentos são por ordem de chegada–, muitas das quais foram embora depois das 13h.
Antes de começar os trabalhos, as conversas no IMA entre voluntários e frequentadores passavam pelo nome de João de Deus, invariavelmente.
“Aqui não tem nada disso [denúncias]. Doutor Alonso e o Berbel são muito sérios”, disse a dona de casa Maria Auxiliadora Clemente, que levou a mãe, com fortes dores nas costas, para uma consulta.
O atendimento no “consultório”, iniciado às 12h, é muito rápido: o médium encosta a mão no paciente e já indica aos seus auxiliares os medicamentos que deverão ser tomados por 30 dias, por meio de códigos.
Após deixarem a sala, com as anotações em mãos, os pacientes vão para a fila do receituário e, em seguida, para a farmácia, onde recebem os remédios.
“Travei de dor nas costas e ciático quando cheguei aqui, doía demais. Agora estou melhor”, disse o mineiro de Borda da Mata José Helcio dos Santos, deitado numa maca, após a consulta.
No local, são servidos, também de graça, café da manhã e sopa, feitos numa cozinha industrial. Consultas e cirurgias ocorrem às quartas e aos sábados.
RENDA
Em comum com o que ocorre em Abadiânia, a venda de livros é uma das fontes de renda da entidade de Franca, ao lado de doações dos frequentadores, segundo Marcos Afonso de Almeida, presidente do instituto. Berbel psicofonou 257 livros e lança em média um novo por mês.
As semelhanças param por aí. Diferentemente de Goiás, onde a casa de João de Deus comercializa frascos de passiflora, calmante natural fabricado pelo grupo, no IMA os medicamentos fitoterápicos são entregues de graça aos frequentadores.
Os pacientes recebem por mês mais de uma tonelada de remédios, produzidos num sítio da instituição – também recebido em doação.
“O tratamento espiritual é um complemento do convencional. Fazendo os dois juntos aumenta a chance de cura”, disse Almeida.
Também não há atendimento individualizado e as cirurgias espirituais são feitas sem cortes –sem lâmina e com algodões embebidos em álcool e iodo. A Federação Espírita Brasileira condena atendimentos individuais, conforme nota divulgada após as denúncias envolvendo João de Deus.
Para aumentar a renda e conseguir pagar os 20 funcionários fixos e construir um hospital espírita – já pronto –, o IMA faz bazares, rifas, eventos (almoços e jantares) e tem uma pequena cantina que funciona num imóvel vizinho. Os trabalhos são conduzidos por 180 voluntários.
O IMA é gerido pelas Obras Assistenciais Dr. Ismael Alonso Y Alonso, mantenedora também do sítio, do laboratório farmacêutico, de um serviço de atendimento a crianças em vulnerabilidade social e do Hospital da Caridade.
O hospital ainda não foi inaugurado, mas já faz 800 atendimentos fisioterápicos por semana, em parceria com uma universidade. Terá 104 leitos no total e o objetivo é atender inicialmente pacientes que necessitem de cuidados paliativos.
A explicação para o IMA não ter lotado sábado como em outros dias não tem elo com a situação enfrentada em Abadiânia, mas sim com a proximidade das festas de final de ano, segundo o presidente da casa.
“É que não pode ingerir nenhum tipo de carne nem beber ou fumar 7 dias antes da cirurgia e 15 dias após. Isso afasta um pouco as pessoas nesta época do ano”, disse Almeida.
Fonte: Folha de São Paulo