CINEMA Os destruidores do Cerrado

Documentário veiculaado pelo Netflix denuncia destruição da maior riqueza do Centro-Oeste. Diretor premiado ignorado pelo FICA aponta suposta trama política para destruir o bioma

Welliton Carlos

Um bioma de 40 milhões de anos está ameaçado pela ganância empresarial e sorrateiras estratégias políticas. É o que se percebe do xadrez montado no Cerrado, santuário de grande interesse mundial, mas que é defendido apenas por minorias.
Documentário premiado por tratar do meio ambiente de forma responsável e não sensacionalista, o vídeo “Ser Tão Velho Cerrado”, do diretor André D’Elia, pode ser visto no Netflix com um discurso racional: ainda existe esperança, mas precisamos agir rápido se desejarmos salvar o bioma.
O vídeo resgata os valores socioambientais do Cerrado e mostra como existem diversos interesses políticos por trás do bioma. Altair Sales, um dos maiores especialistas do estudo deste bioma, afirma no documentário que o Cerrado está em processo irreversível de destruição.
Por exemplo: o diretor jamais conseguiu ter acesso ao Festival Internacional de Cinema Ambiental (Fica), que é, inclusive, realizado em Goiás. André D’Elia é expoente de destaque no cinema ambiental, mas ignorado no principal evento cultural goiano. Seus filmes conseguem ser selecionados para debates em diversos acontecimentos internacionais, mas no festival goiano – até aqui – foi solenemente ignorado. Para se ter ideia, D´Elia é autor do documentário “Amigo do Rei”, que deve estrear em breve. Nele, o diretor relata a tragédia de Mariana.
O festival ambiental goiano, todavia, fingiu que o documentarista não existe. D’Elia diz que está aberto aos convites de palestras ambientais, assunto que resolveu se debruçar nas últimas décadas. Além da narrativa sobre Mariana, ele é autor, por exemplo, do filme “A Lei da Água”, que procura relacionar impactos do novo Código Florestal à crise hídrica brasileira.
O novo Código Florestal, aliás, é tematizador de “Ser Tão Velho Cerrado”. O vídeo procura mostrar toda a pressão contra o manejo a ser realizado na Área de Proteção Ambiental do Pouso Alto.
Percebe-se, pelo vídeo, que inexistiu até aqui uma política ambiental que visa preservar o meio ambiente dentre os goianos. Evidente que o vídeo traz equívocos, como uma entrevista com o guru Prem Baba, descrito pela revista “Época” pelo título “A ciranda de sexo, dinheiro e mentiras de Prem Baba”. Hoje Baba é investigado por supostas violências sexuais.
No documentário, o líder espiritual que aparece muitas vezes ao lado do ex-governador Marconi Perillo diz que “destruímos o Cerrado sem perceber”. Pode ser uma opinião. Mas não é verdade, como o próprio vídeo mostra. Muitos sabem bem o que fazem.

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CORRELATA

Documentário traz suspeita sobre pai de Marconi Perillo

“Ser Tão Velho Cerrado” traz imagens da Chapada dos Veadeiros e apresenta uma curiosa entrevista com o ex-governador Marconi Perillo (PSDB). Questionado por moradores, Marconi tornou-se grande entusiasta da região de uns anos para cá.
Os moradores do Cerrado suspeitam que o agronegócio é que comanda a destruição de santuários como a Chapada dos Veadeiros. E onde entraria o ex-governador? O pai de Marconi Perillo – “Seu Ferreira” – seria proprietário de terras na região.
Ao ser abordado, o então governador diz não saber ao certo onde seriam as terras do pai, mas, de fato, ele teria propriedades na região.
Aos 28 minutos do documentário, surge o diálogo em que o pai do ex-governador é citado como suspeito de destruir o cerrado. “Toda essa área era um cerrado em pé: passaram um correntão recentemente. Dois tratores, com uma corrente gigante, vão levando tudo que tem em pé”, diz uma voz no documentário.

Em seguida, no off do vídeo, aparece a descrição: “esta fazenda (SIC) existem denúncias evidentes que pertencem ao pai do governador de Goiás”.
Conforme o diretor, o “correntão” é usado para fazer “soja transgênica”. “Seu ‘Ferreira’, nessa região, comprou umas cinco fazendas para plantação de soja transgênica”, afirma o documentário.
Outro entrevistado procura ligar as benfeitorias e visitas do então governador de Goiás na região com os interesses financeiros. “Porque você acha que esses ‘asfaltos’ estão saindo aí?”, questiona.
“Tem muito pequizeiro derrubado. ‘Fizeram’ um cemitério de pequizeiro, pequis centenários”, emenda outra entrevista concedida ao diretor.

RAÍZES ESTILHAÇADAS
Conforme o documentarista, na região existem “raízes estilhaçadas” e “marcas de correntes”.
Batizada de “fazenda Gavião”, a unidade, segundo a reportagem do documentário, seria um dos pivôs do processo de desmatamento do Cerrado. Abordado, Marconi realiza sua defesa, nega qualquer irregularidade e afirma desconhecer a propriedade: “Eu não sei de quem é essa fazenda, não tenho esses detalhes todos”.
O repórter retruca Marconi: “Dizem que essa fazenda é do seu pai, seu Ferreirinha”.
Marconi se defende novamente: “Eu não sei, meu pai tem uma fazenda aqui perto, de Colinas… Mas não sei como ela chama também não. E outra coisa: já até pedi para ele vender esse pedaço de terra que ele tem lá. Nós não temos qualquer tipo de comprometimento em relação a isso”.

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Alan Ribeiro
Alan Ribeiro

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